domingo, 2 de janeiro de 2011

QUANDO ... A LÍNGUA VAI NUMA CARRETA.



Dizem que a curiosidade mata. Tenho certeza que não, mas que entorta a língua isso eu não tenho dúvidas. Eu digo isso, porque observei que as pessoas estão ligadas ao que lhes interessa e também ao que não lhe diz nenhum respeito, não lhes cabe e não é da sua devida conta.

Uma senhora passava em frente ao Góes Calmon, na Avenida, quando tirou, da sacola, o celular e começou a dizer:
- Escuta, Joana! Tem um prédio aqui na avenida que pintaro a frente de preto. Quem já se viu uma disgraceira dessa! Num sei cuma é qui o prefeito deixa uma coisa absurda dessa! Deve ter uma lei que proíba uma sujeira dessa!

Eu, que estava bem próximo, já estava impaciente com aquela observação, dirigi-me àquela senhora e disse-lhe:
- Oh, dona! A senhora não acha que está falando demais e de uma coisa que pouco lhe interessa?
- O que? Eu estou fazendo um 21 e o senhor tome parte de sua vida, pois o 21 é quase nada que se paga e vá tomá parte de sua vida.

A dona seguiu viagem. Que Deus a leve. Não demorou quase nada e vem outra mulher, que fala em voz alta:
- Te disconjuro! Como é que bota preto na frente da casa? Ta pareceno o coito de Zumbi.

Eu pensei: “essa vai ter a resposta que merece” e disse-lhe:
- Sabe por que ta assim dona? Isso aí é uma homenagem! É uma homenagem ao Vitória, que saiu da A para a B e ali no meio vai pintar de vermelho.

- Oxente, seu moço! E esse tal de Vitória morreu pra precisar de luto?

- Não, dona! Quando o Vitória voltar para a A muda-se a cor. É só por isso.

- Eu sei lá se vou ta viva pra vê isso! Eu só sei que nem Zumbi ta no agrado disso aí.

Depois dessa conversa extraviada saiu rapidamente, que nem deu ouvidos para o que eu disse. Dois homens vinham subindo a avenida e um deles falou:
- Oxe! Pela primeira vez eu vejo preto na parte de fora.

- É qui preto é a tinta que menos se vende, aí fica vencida e a casa vende mais barato, é um jeito de economizar – explica o outro.

Foi a vez de dois jovens tecerem comentários. Um deles foi dizendo:
- Olha aquilo ali! Que coisa mais exótica. É um barato.
- Oxente! Isso aí ta na moda. É muito zen. Isso é um tratamento delicado, suave na textura primária, que dá uma grande demonstração de morbidez, ta ligado.

Conversaram sem parar e seguiram mudando a conversa. Deixei para lá. Apareceu até um doutor entendido para dar palpite.
- Essa pintura preta não é a mais apropriada para o nosso clima, porque absorve mais os raios solares e provoca o aumento do calor no interior do prédio, por isso não é correto utilizar esse tipo de cor em fachadas, seria melhor uma cor mais clara.

- O prezado é pintor? – perguntei.

- Não, sou doutor.

- Então, o doutor tem que compreender que aqui na avenida ocorre muito engarrafamento e os veículos desprendem muito dióxido de carbono que vai poluindo a atmosfera e essa fuligem fica impregnada nas fachadas das casas, sendo assim, a pintura com a cor preta absorve e esconde essa sujeira, daí o preto ser uma pintura apropriada e adequada para as localidades que são vertentes de um trânsito intenso e confuso.

- Muito grato pela explicação, que me deixa mais tranqüilo, pois justifica plenamente e sacia a minha busca de conhecimento.

Apareceram três molecotes fazendo algazarra e o magricela falou:
- Olha, doido! Qui cor mais horrorosa!
- Aquilo não é cor não, seu burro! É só pra queimá, maluco.

Eu fiquei pensando: “queimar o que?”. Antes que eu esqueça: vá todo mundo tomar naquele lugar.

Um comentário:

  1. Caro Profº Agildo, me divirto sempre com suas crônicas. A "homenagem ao Vitória" foi ótima, só faltou dizer que naquele prédio terá "ELEVADOR", assim a homenagem ficaria completa!

    Abraços,

    Renato Santos

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