segunda-feira, 8 de outubro de 2018

CASAMENTO DA 54 COM A 55


Domingo, dia de sossegar. Mesmo sendo um dia de eleições presidenciais, o eleitor tem que ter a tranqüilidade para votar e exercer seu direito democrático. Estou querendo paz, tranqüilidade e calmaria. Correria na urna, para andar ligeiro e descansar, afinal, trata-se do Primeiro Turno, das presidenciais, em Ipirá-Ba

Antes de sair de casa, liguei a televisão que apresentava a coletiva da ministra Rosa Weber, presidente do Tribunal Superior Eleitoral TSE, que falava dos avanços tecnológicos do sistema eleitoral brasileiro, argumentava sobre a tranqüilidade, a transparência, a eficiência, a lisura e a rapidez do processo eleitoral, que apresentava os resultados gerais em algumas poucas horas, num tempo recorde para um país continental Tudo isso para valorizar o exercício da cidadania e o bem-estar do eleitorado brasileiro. Coisa inimaginável e do outro mundo.

Fiquei admirado e arrebatado. Pense num sentimento profundo e indizível que aparenta corresponder a uma enorme alegria, assim estava eu; tomado por um orgulho alvissareiro e com aquela vontade exacerbada de exercer meu direito de cidadania num sistema perfectível, avançado e de primeiro mundo. Nada melhor do que ser brasileiro e melhor ainda, ser eleitor brasileiro.

Almocei na hora certa, descansei um pouco e fui cumprir meu dever cívico, na seção 55 da Escola Alzira Bela, na cidade de Ipirá. Estava sereno e fazia uma previsão de alguns minutos para exercer o meu direito sagrado, constitucionalizado e respeitado do voto, ainda mais, quando o meu voto carrega um caráter libertário e de coerência com a manutenção da democracia.

O primeiro impacto teve a força de uma facada na boca do estômago. No pátio da escola, um pequeno cubículo, estava um amontoado de eleitores querendo exercer o direito do voto. Tinha que haver uma fila! E, realmente, tinha uma fila labiríntica, de feitio tão complicado que só a muito custo o eleitor encontrava o fim da fila.

Colocado no fim daquela intrincada e entrelaçada fila percebi que a coisa era complicada e obscura. Eram precisamente 14 h. A luz solar adentrava pela porta do cubículo e incomodava-me bastante, a fila andou meio metro e eu saí daquela posição incomoda. Comecei a pensar sobre o porquê daquela situação e constatei que era devido ao casamento da seção 54 com a seção 55 e num local que havia quatro seções passou a ter somente duas. Estava explicado.

Com meia hora eu já estava agoniado, um calor infernal e o suor escorrendo pela face e pelo corpo e eu sentia que a subaqueira estava virando uma lagoa e aquele rebanho de eleitores espremido naquele cubículo estava começando a ficar impaciente: “Essa fila é coisa do capeta!” gritou um eleitor, que foi rebatido por outro eleitor: “Do capeta nada, isso só pode ser coisa de um jumento!”

Eu não disse nada, mas eu sabia que o jumento trabalhador e perfeccionista do jeito que é não seria tão burro para cometer uma mancada de tamanha envergadura para sacanear com a cara do eleitor. Eu pensei: “Isso deve ser invencionisse de algum quadrúpede burocrata para espezinhar o eleitor!” pensei, mas não falei.

Com uma hora na fila eu já estava irritado. Numa fila eleitoral e ninguém podia falar de política. Seria crime eleitoral. Eu notei que as pessoas estavam ficando estressadas. Aí, Luís da Laranja falou comigo: “Essa fila é de rosca, parece o Matadouro de Ipirá, não sai do lugar” É verdade Luís! Isso aqui não sai do lugar e é um Matadouro de Eleitor. Pensei e falei.

Eu nem vou falar o que é fila. É muita confusão e não tinha ninguém, ninguém mesmo, para dar uma orientação e organizar aquele troço. Se fosse eleição de jacu e macaco a bagaceira seria grande. Mas, vamos que vamos, porque o eleitorado apertado, agoniado, já está irritado: “Por causa de uma disgrama de um voto, sou obrigado a enfrentar uma merda dessa!” falou alguém. E tinha gente chegando e gente esperta furando fila. “Eu estou amamentando e se eu não votar agora eu vou embora, não vou deixar meu filho passando fome” Será que o voto agora vai acabar com a fome neste Brasil? Seria bom que o voto deixasse de ser esperteza, mas vamos que vamos porque meu problema é a fila.

Duas horas em pé, com a fila andando à passo de tartaruga. Tinha eleitor esperneando: “Por causa da desgraça de um voto, vou ter que agüentar uma p.... dessa!” Olha a que patamar estava chegando o voto, tudo por causa do massacre que estavam impondo ao eleitor.

A fila já estava pelo lado de fora. Com duas horas e meia, eu cheguei à porta da sala da 55 coloiada com a 54. Tinha um papel oficial do TRE afixado na parede, escondido, por trás da fila. O papel olhou para minha cara e disse: “Você é um otário, levou mais de duas horas numa fila quando tem direito a prioridade, kakaka!” Aí foi que eu fiquei arretado, mas eu não vou discutir com uma folha de papel sacana, que é tão f.d.p que acha que quem está na merda de uma fila para dá a p.....de um voto é otário, besta, babaca e o car......

Eram quase 17 h quando teclei a urna e enfiei o voto. Três horas! O tempo de um deslocamento de Ipirá a Salvador, gasto enfrentando uma fila para votar na escola Alzira Bela, em Ipirá.

Muitas vezes, a tecnologia de primeiro mundo não clareia a mente de quem organiza o processo. O eleitor que pague o preço. Não vai aparecer um capeta para pedir desculpa ao eleitor. Não vai aparecer um candidato para agradecer ao votante. Saí da seção, cansado, aporrinhado e sacaneado, mas com todo esse sacrifício e diante de tanta indiferença, eu comparecerei ao segundo turno, porque o meu voto é o meu esforço para não deixar o fascismo tomar conta desse país.

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