Vivenciamos uma tragédia: a
economia rural de Ipirá está falida. Não por causa do tsunami japonês, nem do
furacão do Caribe, muito menos pelas enchentes do Rio de Janeiro. A tragédia
deles é televisiva, causa estrago e destruição repentina, milhares de mortes
num só instante. É o desmoronamento do mundo quase-perfeito pelas intempéries da
natureza. Causa sensacionalismo midiático. É a infelicidade dos outros
regurgitando em nossas lágrimas e o Nordeste solidário tira do seu quinhão para
reconfortar os irmãos. Requer mobilizações grandiosas e recuperações majestosas
e imediatas. Toca no coração e no sentimento.
A nossa tragédia no semi-árido
nordestino é anunciada, é lenta, insistente, demasiada e abrangente. A nossa
tragédia não é repentina, abrupta como um raio; a nossa tragédia é insistente,
demorada, prolongada, vezeira e costumeira. Tira a vida aos poucos, surrupiando
lentamente. Não é um impacto momentâneo, é um grandioso impacto de inumeráveis
e prolongados momentos; previsíveis momentos. A televisão vê a nossa tragédia;
a televisão não enxerga a nossa tragédia. A nossa! É nossa velha companheira,
companhia inseparável por longos e intermitentes anos; vai e volta, é nossa
costumice, nos acostumamos. A nossa tragédia não é obra de PAC de Copa do
Mundo, a nossa tragédia é obra de PAC encalhado. Não arranca lágrimas.
A economia rural de Ipirá está
falida. Falo Ipirá porque moro em Ipirá. São 6.813 propriedades rurais vítimas
da estiagem prolongada e acima do suportável. São 6.813 propriedades
definhando, perdendo gordura e peso, precisando de ração racionada, vivendo à
míngua minguada, perdendo força, caindo, levantando por meio de panca, caindo
sem levantar, olhos entristecidos de tristeza, esperando a morte anunciada. Uma
catástrofe.
Os que sobrevivem com recursos
próprios, parcos e minguados recursos, encontram-se sem condições, mas em condições
de fazer somatório com aqueles que sobrevivem com recursos do assistencialismo
governamental. Caridade com carimbo federal e estadual. Caridade com cara de
bondade de quem não apresenta um projeto efetivo para soerguer quem está com as
mãos estendidas e com a vergonha no coração. São 6.813 propriedades rurais
esgotadas.
A economia rural de Ipirá está
entregue à própria sorte ou falência. As perdas são irreparáveis, os prejuízos
são incontáveis. Todas as tentativas de fazendas modelos em Ipirá minguaram.
Neste momento, o melhor exemplo de propriedade rural produtiva em Ipirá não
consegue um único recurso para suportar a adversidade. A saída é vender o
plantel de vacas leiteiras, trabalho de anos à fio, para mais tarde, quiçá,
começar tudo de novo, viver tudo novamente. Faço votos que não signifique o
pressuposto da inviabilidade deste município. A Nestlé quando foi embora de
Ipirá bateu o martelo: é inviável. Um terrível carimbo. O fazendeiro Itamar de
Alagoinhas indagava perplexo e satírico: “quem foi que disse ao povo de Ipirá
que isso aqui é bacia de leite?” Ganhou mais de 1 milhão de reais com a seca em
Ipirá. Não veio agora, porque Alagoinhas também é vítima da seca.
No sistema financeiro que atua em
Ipirá é mais fácil encontrar dinheiro para comprar um automóvel zero do que um
tostão para salvar uma vaca (exceto o Sicoob). Eles não acreditam na capacidade
de recuperação de uma economia rural no semi-árido; que exploda na falência. O
governo implementou o projeto “garantia safra”, um vale para quem perdeu a
safra, ou melhor, para contentar e calar quem nem plantou para ter safra, são
mais de cinco anos sem chuvas constantes. São 760 reais para cada família em
caso de perda da safra. É o puro assistencialismo imediatista, produzido e
manejado por quem não apresenta um projeto efetivo para botar esse semi-árido
para produzir e viver de seu próprio sustento.
São 6.214 agricultores de
característica familiar em Ipirá. Só 1.440 famílias da agricultura familiar em
adesão. O município receberá mais de 1
milhão em sua economia. Um bom negócio. Nesse momento e nessas condições isso
tudo é válido. Se esta seca fez o município de Ipirá perder mais de 60% do seu
rebanho, por venda abaixo do preço ou morte, o prejuízo chegará a algo em torno
de 18 milhões. Um péssimo negócio.
A economia rural de Ipirá está
entregue ao seu próprio destino, a falência. Estamos, ainda, no estágio do
carro-pipa. São sete carros-pipas em parceria com o governo federal e treze com
recursos próprios. O governo do estado entra com 250 mil reais para
complementar o abastecimento. O governo só garantiu 800 h para limpeza de
aguada, a 100 reais a hora, coitadinho do Estado! Na urgência e emergência tudo
é bem-vindo, até chuva de goteira. As ações implantadas pelo governo: como
bolsa família, crédito-estiagem, prorrogação de dívidas, ação de carros-pipas,
garantia safra dentro de um quadro de calamidade pública em que vive o
município, neste caso, tudo é válido, mas é paliativo. Esse não pode ser o
limite para quem vai produzir na zona rural de Ipirá.
As políticas públicas devem
apresentar um projeto à médio e longo prazo para o semi-árido e o poder
municipal local tem que ter um projeto para Ipirá. É necessário, importante e
providencial que se proteja com programas assistencialistas os que não possuem
ou não conseguem tirar renda da terra. É necessário e importante que se apóie
quem faz uma unidade de produção no semi-árido produzir de forma sustentável. A
melhor modelo de produção na região de Ipirá não tem onde buscar recurso para
suportar as dificuldades do momento, não encontra uma linha de crédito
emergencial e, até para conseguir energia para a unidade exemplar foi uma
dificuldade tremenda. Quem vai desse jeito não vai a lugar algum.
O grande problema é tornar esse
município viável, com trabalho e renda. Se o município de Ipirá for obrigado a
viver eternamente de assistencialismo, significa que estará sendo obrigado a
ser eternamente inviável. O assistencialismo é corporativista, não enxerga que
o município de Ipirá é caracterizado por uma grande quantidade de pequenas e
médias propriedades rurais. A falência da zona rural de Ipirá significa 6.813
propriedades sem produção, sem trabalho e sem renda. É exasperante e
preocupante.
Que esse manifesto não sirva de
alerta, da vaca só resta o esqueleto, mas que seja uma faca afiada para
arrancar as vozes acostumadas a não dizer nada. O município de Ipirá depara-se
com um grande problema tão antigo e previsível, tão massacrante e perverso
quanto a completa ausência de políticas públicas permanentes de apoio e
assistência técnica continuada que combata e reduza os efeitos que a natureza
produz constantemente no sertão. O sertanejo não pode perder a esperança.
ESTA POSTAGEM DE AGILDO BARRETO REFLETE A MAIS PURA REALIDADE PQ PASSA IPIRÁ E TODA NOSSA REGIÃO INCLUINDO AÍ FEIRA DE SANTANA. PARA SE TER UMA IDEIA, O REBANHO BOVINO Q CHEVA A 250 MIL CABEÇAS ESTÁ REDUZIDO A APENAS 27 MIL, PODENDO ZERAR BREVEMENTE SE NENHUMA ATITUDE URGENTE FOR TOMADA PARA A REVERSÃO DESSE QUADRO DE HORROR Q NOSSO POVO ESTÁ PASSANDO NO MOMENTO. BELA(E TRISTE) REFLEXÃO PROFESSOR AGILDO!
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ResponderExcluirPrezado Agildo, parabéns!
Seu MANIFESTO traduz brilhantemente a situação de flagelo em que se encontram TODOS os produtores e trabalhadores rurais de Ipirá. É, sem dúvida, a “completa ausência de políticas públicas permanentes” que tem perpetuado a seca como mazela do sertão nordestino. As “Medidas Emergenciais” de agora trazem basicamente o mesmo discurso e inconsistência das ”Frentes Produtivas”, “Frentes de Trabalho” ou “Frentes de Emergência” das secas passadas.
Aguardamos pacientemente pelo milho que nunca chegou e enfrentamos a indiferença burocrática para liberação de um “crédito de emergência” cuja emergência só está no nome. Chegou a hora de perdermos a tolerância. Precisamos gritar a nossa dor. Para tanto estamos organizando, em parceria com a FAEB e diversos sindicatos rurais, uma mobilização em Feira de Santana no próximo dia 15 (segunda-feira), as 9:00 horas no CDL em frente à Praça da Matriz. Contamos com sua participação.
Grande abraço
José Caetano Ricci de Araujo
Prezado Agildo, parabéns!
ResponderExcluirSeu MANIFESTO traduz brilhantemente a situação de flagelo em que se encontram TODOS os produtores e trabalhadores rurais de Ipirá. É, sem dúvida, a “completa ausência de políticas públicas permanentes” que tem perpetuado a seca como mazela do sertão nordestino. As “Medidas Emergenciais” de agora trazem basicamente o mesmo discurso e inconsistência das ”Frentes Produtivas”, “Frentes de Trabalho” ou “Frentes de Emergência” das secas passadas.
Aguardamos pacientemente pelo milho que nunca chegou e enfrentamos a indiferença burocrática para liberação de um “crédito de emergência” cuja emergência só está no nome. Chegou a hora de perdermos a tolerância. Precisamos gritar a nossa dor. Para tanto estamos organizando, em parceria com a FAEB e diversos sindicatos rurais, uma mobilização em Feira de Santana no próximo dia 15 (segunda-feira), as 9:00 horas no CDL em frente à Praça da Matriz. Contamos com sua participação.
Grande abraço
José Caetano Ricci de Araujo
Agildo Barreto, uma boa noite. Eles não são somente Insensíveis mas, Irresponsáveis e Incompetentes estes são os nossos representantes políticos não importam, não olham para os produtores rurais, só pensam nas eleições que se aproximam. Um forte abraço, Nelson Quadros. Sindicato Rural de Vitória da Conquista
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