terça-feira, 20 de outubro de 2020

ARNALDO BARRETO VILA NOVA


Não posso falhar nesse artigo, trata-se de reconhecimento, agradecimento, gratidão e, se bem posto, de ampliação da solidariedade.

 

A palavra escrita tem que entrar na medida exata e na forma correta, com toda a força ou intensidade do seu significado. Tenho que ter a precisão e buscar um sentido para o texto, que tenha importância e alcance. Não sei por onde começar. Uma pergunta vem em meu apoio e apresenta-se como um socorro.

 

Qual é o bicho que mais mata o ser humano?

A comunidade científica aponta o hipopótamo, esse brutamonte corpulento e pesadão, que pesa toneladas, visível a qualquer olhar e merecedor do devido respeito. É extremamente territorialista; possui uma força descomunal; mata, trucida, esmaga e esquarteja qualquer estranho que se aproxime.


Os humanos não constam no cardápio de nenhuma espécie. As mortes de pessoas causadas por animais são considerados acidentes

Neste ano de 2020, um ataque avassalador já matou mais de1 milhão de pessoas no mundo e mais de 153 mil pessoas no Brasil. Não foi ação do brucutu pesando toneladas, mas de uma forma diminuta de vida, invisível a olho nu; infinitamente inferior e primitiva: o coronavírus.

Sem autonomia, aloja-se e esconde-se num hospedeiro para se reproduzir no interior de células vivas e ali fica circunscrito. No mundo globalizado, quando acontece a quebra e o rompimento da bolha, ele torna-se um expansionista avassalador, aí ninguém segura. Da China viajou de carona em supersônico pelo resto do mundo. Chegou à Crateús, no Ceará.

Arnaldo Barreto Vila Nova

Classe: Professor Assistente
Função: Coordenador do Curso de Sistemas de Informação
Área de atuação:

Computação Gráfica

Arnaldo Barreto Vila Nova, 34 anos, filho de Eduardo Vila Nova e Anete Barreto (minha irmã), meu sobrinho e afilhado. Professor da Universidade Federal do Ceará, unidade de Crateús.

Arnaldo tem uma inteligência perspicaz, com grande capacidade de assimilar conhecimentos de alta complexidade. Fez mestrado em Recife e doutorado em Fortaleza, na área de Ciências da Computação e Análise de Sistema. Se o Brasil fizesse uma seleção das 100 melhores pessoas com conhecimento de ponta nesta área, sem dúvida, ele estaria entre elas.

Recordo-me de um episódio, em que seu irmão Duda Vila Nova narrava que Arnaldo abria um livro em que todas as páginas eram exclusivamente preenchidas por números e que ele olhava-as e soltava um sorriso maroto, era a confabulação com páginas num entendimento envolvente; era a decifração de uma codificação numérica complexa, num esforço para apreender a essência da simplificação da vida. Para ele isso era uma brincadeira de criança.

Em Crateús, Arnaldo foi infectado pelo coronavírus. Era o início de uma batalha de vida ou morte. Num leito de hospital em Fortaleza travava-se uma luta ferrenha contra o vírus. A carga do coronavírus tinha o peso de toneladas e o oxigênio era disputado como o bem mais precioso para a vida.

Um corpo humano sob toneladas de terra procurando ar para respirar. Uma pessoa caindo num silo gigante de grãos buscando um suspiro para a vida. Um ser humano soterrado numa mina bloqueada esforçando-se por achar uma bolha de ar. Um náufrago na agonia do afogamento pedindo com insistência um sopro de ar. A vida por um fio. Quantos leitos de hospitais tornaram-se um campo de batalha nessa luta renhida contra a morte por sufocamento? Foram milhões pelo mundo afora.

Os médicos e enfermeiras do hospital contra a Covid-19, em Fortaleza, numa dedicação profissional e pessoal obstinada e perseverante se doaram por inteiro nesta luta da vida contra a Covid-19. Um comprometimento inquestionável; uma coragem invulgar; um desprendimento generoso; um humanismo profundo. Arriscando a própria vida em UTIs, expondo-se a risco de se contaminarem, a bom ou mal sucesso, não arredaram os pés, não desertaram do campo da batalha. Quantos profissionais da saúde se sacrificaram, até com a própria vida, nesta batalha contra a Covid-19? A humanidade tem muito que agradecer e reverenciar aos profissionais da saúde que se colocaram na linha de frente no combate à Covid-19, botando a cara ao sol.

O ambiente da UTI é de segurança máxima e isolamento completo. Ficamos na trincheira aguardando o boletim médico expedido diariamente às12 h. O limite de espaço era extenso (Fortaleza / Salvador / Alagoinhas / Ipirá); o tempo se alongava de forma demorada; a comunicação era agilizada pelas redes, o atraso na divulgação de boletins aumentava a ansiedade. Adotei o critério de não querer a chamada do meu celular antes do boletim. Foram dias de apreensão, receio e medo.  A esperança era persistente. Quantas famílias vivenciaram os limites dessa fronteira pelo mundo afora? Milhões de pessoas.

Arnaldo ficou quase 30 dias no hospital contra a Covid-19, em Fortaleza, sendo alguns dias na UTI. O procedimento médico mais delicado foi a implantação de um tubo flexível de calibre considerável empregado para conduzir o ar do respirador pela traquéia. Constantemente, era obrigado a ficar de bruços para respirar melhor. Em estado de coma induzido ficou inconsciente por dias, nos quais se perderam as atividades cerebrais superiores, conservando-se a respiração e a circulação;

Seus órgãos mantiveram certa resistência ao ataque. Agradecemos de coração à Dra. Luciana, ao Dr. Rafael e ao corpo de enfermagem que atuam na UTI, em Fortaleza. Os procedimentos médicos, desde o início, quebravam a volúpia do vírus e fortaleciam o organismo para o retorno à vida.

Quando Arnaldo foi estimulado a despertar ficou agitado e apreensivo, não se situava naquela parafernália de equipamentos e pessoas protegidas por equipamentos de segurança. Um áudio de sua companheira Lílian de Oliveira, também, professora da Universidade Federal do Ceará, trouxe-lhe a calmaria e um sorriso aos lábios.  Arnaldo estava de volta à vida.

Esse papo de ‘efeito manada’ que algumas pessoas defendem, seria um sacrifício sem consideração, massivo e de forma discriminada, sem nenhuma chance para os que possuem um pouco de chance de sobrevivência.

Podemos até dizer que o coronavírus é uma forma de vida inferior no aspecto evolutivo. Podemos falar que é uma coisa ruim, perversa e cruel dentro de uma motivação exclusivamente humana, mas dificilmente poderemos dizer que é uma coisa insignificante, não podemos negá-lo, muito menos discriminá-lo; ele, também, é natureza. Ele existe e persiste. Se o vírus tivesse um querer, sem dúvida, só queria o devido respeito da sociedade humana.

O coronavírus continua circulando em busca de um hospedeiro e de vítimas. A comunidade científica continua a combatê-lo sistematicamente. Os pesquisadores debruçam-se diuturnamente em busca de uma vacina. O corpo médico e o pessoal da enfermaria não arredam da linha de frente da batalha contra a Covid-19. O conhecimento científico é a base de apoio nessa batalha. A humanidade não pode ficar de vacilo diante do perigo.

Todas as orações, preces, pedidos, súplicas, rezas, falas, pensamentos, prédicas, solicitações, rogos, promessas, preocupações, apoios, lembranças e emoções formaram uma corrente positiva e potente com força suficiente para formar um lastro de solidariedade humana neste e nos milhões de casos mundo afora.

“Eu nunca pensei em sorrir para um copo com suco pastoso de acerola” disse Arnaldo, que incomodado exclamou mais tarde: “Chega desse troço no pescoço me machucando e tosses insuportáveis!”  Que alegria e felicidade para todos nós!  Arnaldo venceu a Covid-19.

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