quarta-feira, 27 de maio de 2009

É DE ROSCA.


Estilo: ficção.

Natureza: novelinha.

Capítulo: 20. (mês de maio 2009)



Cena: dentro da residência

O prefeito Dió levava um papo descontraído com Luiz do DEMO (que se diz PMDB), intercalado com sonoras gargalhadas e pequenas bebericagens de vinho, acompanhadas com canapés como tira-gosto.


Cena: no meio da rua.

Em frente à casa do prefeito Dió, o couro comia e a multidão arrebatada espremia-se para acompanhar, na condição de cidadania de terceira categoria, aquela fuzarca de jacu e macaco, que mobilizava, entusiasmava, apaixonava e irracionalizava milhares de pessoas em torno daquele conflito tolo, entre: Tonha, representante da jacuzada, e Natalina, representando a macacada.

A grudação das duas era pegajosa. O bolo que formavam abraçadas, rolava pelo chão parecendo uma jibóia engolindo bezerro. O confronto era duríssimo e em determinado momento, Tonha conseguiu desvencilhar sua mão e empurrou o dedão no Fê-O-Fó da macaca Natalina, que gritou furiosa:

- Êpa ! vamo parano pur aí; sem essa de impurrá o dedão no meu Fê-O-Fó; quem impurra aqui é o 22, é a macacada.


- Qui macacada, qui nada ! quem tá impurrano o dedão no parreco dessa macacada toda é o prefeito Dió – retrucou a ex-empregada Tonha.


- Cala a boca sua jacu dispeitada. Quem tá na vez é a macacada e é a macacada quem tá cumeno e é quem pode cumê, ai fica essa jacuzada discarada, doida pra lambê uma carne de pescoço e não acha. Tá tudo com dô de cutuvelo e ispiriguitada, enquanto a macacada tá cumeno é chupa molho – atacou Natalina.


- Deixa de sê besta macaca safada, que vocês não paça nem os beiços na pelanca, que dirá cumê chupa molho. Só quem come nessa Ipirá disprotegida é um molhinho desse tamainho, ou melhor, uma trempezinha, ou melhor ainda, uma panelinha – acrescentou Tonha.


- E no tempo que a jacuzada tava na prefeitura num era do mesmo jeito ? Só comia meia dúzia de crocodilho e o resto pastava – disse Natalina.


A briga entre as duas ex-empregadas continuava rolando. Aquela discussão surrada e amassada prosseguia sem nexo e com a mesma substância de quarenta ano atrás. Ipirá está enfiada na fanfarronice da inutilidade. Ipirá tem 94,6% da população vivendo com até dois salários mínimos. Esse é o laço no pescoço do gado. O tronco fica logo adiante, é o caminho mais próximo.


Novamente, cena dentro da residência.

O prefeito Dió e o ex-prefeito Luiz do DEMO (que só quer ser PMDB) recebiam as notícias da rua pelo celular, via torpedo: "enfiaram o dedão no Fê-O-Fó da macaca Natalina".


- Quá, quá, quá, quá... ! ou rs, rs, rs, rs... (risos, como se bota na Internet) - os dois, o prefeito e o ex-prefeito, deliciavam-se.


- E o pior, é ela ter que ficar três anos e meio com esse dedo no buraco. Quá, quá, quá, quá... – estatelava-se o prefeito Dió.


- Há, há, há...! assim eu morro de rir. Eu fico pensando é no cheiro que vai ficar nesse dedo daqui a três anos e meio. Há, há, há ! eu vou morrer de rir. Oh ! Ipirá bom. Isso aqui é o paraíso; nem o céu é melhor do que Ipirá – arrotava o ex-prefeito Luiz do DEMO (que afirma que é PMDB).


Neste exato momento, graças à alta tecnologia, iria começar a grande conferência internacional, entre os três grandes líderes mundiais, cada qual no seu mundo: o prefeito Dió; o ex-prefeito Luiz do DEMO ( que insiste em ser PMDB) e O’Brama, que todo mundo conhece. Neste devido instante, lembrei-me do apresentador Sílvio Santos, quando aparece no vídeo e coloca a mão para fora apertando a mão do baiano. Assim fêz O’Brama, colocou a mão e saudou o prefeito Dió:

- Oh! My friend prefeito Dió. Não vejo a hora de ir nessa falada cidade brasileira, ou melhor, desculpem-me, vou ratificar, brasileira não, do mundo, para aprender umas manhas com my friend.


- Oh ! meu brother O’Brama. A honra é toda minha. O que é que meu brother quer que eu lhe ensine ?


- OH! My friend prefeito Dió. Quero saber como é que eu posso viajar para Salvador, voltar para minha metrópole na terça à tarde, trabalhar na quarta e retornar à Salvador na quinta pela manhã ? E o mais importante, sem o povo dizer nada.


- Oh ! meu brother O’Brama. Isso é mole prá gente, quando o meu brother O"Brama vier aqui, a gente entra nos detalhes. Agora converse com meu ex-líder, o ex-prefeito Luiz do DEMO, que tá tirando onda de PMDB.


- Oh! My friend Luiz do Demo, tu nunca foi PMDB. Como eu queria conversar com você. Sabe como é, né ! tem coisa que a gente não sabe e tem que ouvir quem sabe. Como é que eu faço para fazer um Aterro Sanitário que vale um com faturamento no valor de dez ?


- Oh ! mister O’Brama, isso é só facilidade. É só pegar nota fiscal de uma livraria, aí ninguém vê, e se correr uns trocados por fora, ninguém ouve, nem fala.


- Ok ! my friend Luiz do DEMO (que gosta de enganar com PMDB) passe aí para o my friend prefeito Dió. Oh ! my friend prefeito Dió, eu só vou aí, em Ipirá, se tiver carne de sheep. Good bye.


Ficando à sós, o prefeito Dió interpelou o ex-prefeito Luiz do DEMO (que acredita que é PMDB):


- Eu estou com meu inglês em dias, mas essa palavra sheep, que o O’Brama disse é nova. O que deve ser isso ?


- Eu também não sei, mas deixa eu entrar em contato com meus children que moram lá para saber o que é – em um instante entrou em contato com os States – meu children o que significa sheep ?


- Is carneiro, my father – respondeu o filho.


- É carneiro, prefeito Dió.


- É mesmo ! grande filho da puta é esse O’Brama ! até esse ianque imperialista está contra mim. Será que esse gringo está pensando em invadir Ipirá para fazer um Matadouro de Carneiro ? Ele que venha. Ele vai ter que enfrentar minha Guarda Municipal. Bem ! é verdade ! primeiro eu vou ter que fazer concurso para a guarda pública. Bem ! é verdade ! antes eu tenho que contratar uma empresa fuleira para fazer esse concurso. Bem ! é verdade ! antes eu tenho que fazer a licitação. Bem ! é verdade ! prá tudo isso, eu tenho que ter dinheiro. Bem ! é verdade ! a crise econômica deixou a prefeitura de Ipirá sem um tostão. Bem ! é verdade ! acreditem no que eu digo. Será que eu vou ter que repetir: IPIRÁ NÃO VAI TER MATADOURO DE CARNEIRO, nem que o porco chauvinista do O’Brama queira.

SUSPENSE: e agora ? o que será que vai acontecer ? Carne de carneiro ? o matadouro ! você sabe que não sai. Só falta apelar prá quem ? Será que Deus vai mudar a cabeça do prefeito ? Ou será o diabo ?

Leia o capítulo 19 – abril 2009 - logo abaixo.

OBSERVAÇÃO: essa novelinha é apenas uma brincadeira literária que envolve o administrador e o matadouro e, sendo assim, qualquer semelhança é mera coincidência.


quarta-feira, 20 de maio de 2009

Coisa íntima.



Quando o blogueiro posta qualquer coisa no seu blog, ele o faz para que as pessoas leiam o seu ponto de vista, a sua opinião, até mesmo, a sua contribuição sobre qualquer coisa ou questões que nos afetam e que tem gente de olho. Os leitores são os grandes observadores que podem concordar ou discordar do que foi dito ou escrito, ao tempo, que podem se manifestar, caso assim o desejem. Mas, neste momento, antes de colocar qualquer outro artigo, eu tenho necessidade de escrever para mim, para minha pessoa, para o meu íntimo.


Embora, seja improvável ou tempestuoso resumir a vida, pressuponho a montagem de um álbum de família em que, numa determinada fase, ocorre a construção de um retrato, no qual vai ocorrendo o preenchimento do campo visual e a cena vai ficando repleta de gente: gente graúda, gente miúda; não importa a estatura, o importante é que é composto de gente de verdade e que tem que fazer jus a isso. Essa é a grande essência do retrato. Em uma outra fase, ocorre a desconstrução do retrato. As pessoas vão saindo do retrato, que vai perdendo gente e vai esmaecendo, até que o último sobrevivente deixe a cena; restando só o velho retrato, que vira memória, e uma firme convicção: na vida tudo se transforma.


Eu escrevo tudo isso, porque quero fazer uma homenagem a Paulo Guimarães Rebouças. Pensei num poema, mas tenho receio que falte a palavra milimetricamente correta e não atinja a plenitude. Como escrever algo ? Poderia negligenciar as virtudes e exacerbar nas falhas de um ser humano. Posso até fazer uma frase: Paulo Rebouças teve uma existência harmônica e feliz com Leta, nas circunscrições do seu lar. Escrevi tudo e não disse nada. Meu testemunho poderá ser incompleto e estar distante do que deveria ser dito. Poderia falar da tristeza que nos tomou, mas é mais salutar afirmar que o ente que partiu era querido. Poderia expor a dor da perda, mas o vazio deixado deverá ser completado pelas recordações dos momentos que serão lembrados pela saudade.


Para fazer uma homenagem simples, verdadeira e justa, basta falar de Paula, Keu e PH e, neste ponto, faço o reconhecimento da grandeza de Paulo Rebouças, que nos momentos de tranquilidade ou nos de maior rispidez, não se furtou de um dever básico de pai, que é a educação dos filhos e soube dar o exemplo centrado em valores e teve o cuidado com a formação do caráter e o estabelecimento dos princípios que os acompanharão ao longo da vida. Aqui fica o meu reconhecimento. Descanse em paz. Parece-me uma frase apropriada para revigorar este momento em que a saudade é muito forte e a certeza de que a vida de Paulo foi vivida, porque foram tempos de amizade, e que você seguirá conosco guardado no coração e na memória. A brevidade é nosso tempo. Até lá.

sábado, 2 de maio de 2009

É DURO DE DOER.


No Rio Grande do Sul, um rapaz drogado, viciado em crack, ameaçou a própria mãe, que foi obrigada a defender-se: atirou no próprio filho. Além de matar o único filho, ficou uma chaga corrosiva no seu coração de mãe. Uma tragédia. Esse tal de crack dilacera vidas e destrói famílias.

Em Ipirá, esse tal de crack chegou sem pedir licença. Ninguém sabe onde fica, mas está presente e bem presente. É muito fácil encontrá-lo, pois apresenta-se em qualquer esquina, viela ou cloaca desta cidade. Está em profusão. Serpenteia volúvel e vertiginoso pelas bocas, ingressando na vastidão das mentes. Penetra sagaz nas franjas sociais, imiscuindo-se nos setores mais debilitados, nas hostes mais voluntariosas, nos seres mais angustiados e impulsivos. Atua onde houver vida propensa aos seus favores ou aos seus estragos. O vício é tenebroso e teremos a nossa cracolândia, quem viver, verá. São tempos nebulosos e destruidores de efeito devastador. Estamos diante de uma tragédia anunciada.

Como o destino é irônico ! esse tal de crack, a juventude de Ipirá encontra em qualquer esquina. A Biblioteca Municipal Eugênio Gomes ninguém sabe onde está. Sumiu, simplesmente sumiu. Onde encontra-se o acervo da Biblioteca Municipal Eugênio Gomes ? Tudo indica que em algum buraco ou mesmo, corroendo-se em algum depósito. Pouco importa, só temos a lamentar essa tragédia, pois que, a quimera tem a força para alimentar uma vida juvenil sedenta de curiosidade e repleta da fome de informação e de conhecer. Um livro tem força; é forte, saudável e move o mundo; podendo ser um encontro, um belo encontro.

Para não dizerem por aí, que só falo de espinhos. É bastante louvável a idéia, em gestação, da Biblioteca Ambulante, que aos domingos, assim penso eu, adentrará pelos bairros, em um ônibus, ou uma kombi, ou uma van, ou num Fiat, ou numa carroça, seja lá o que for, cheia de livros, para que as crianças, os jovens, a dona-de-casa, o adulto, veja-os, folhei-os, leia os títulos, tome intimidade, requisite-o para que passe uma semana ou mais em sua casa, sem dúvida, terá um grande amigo no seu convívio.

Só em pegar um livro, uma criança sentirá o deslizar de suas mãos por um corpo suave, permissivo, perfeito, harmônico e figurativamente permeável; muito diferente da superfície que de tão dura doe as mãos, carquilhada, imperfeita, disforme, ondulada e grotesca do cristal de crack. As consequências são infinitamente diferentes. Assim penso eu; algumas mentes pensam assim; outras nem tão bem assim, porque acham que não adianta bater a testa no batente, porque é duro de doer.