Diomário
chegou à Ipirá na década de 1960, com uma calça Lee desbotada, duas mudas de
camisa, uma carteirinha de militância no Partidão; trouxe régua, compasso e a
sabedoria que conseguiu extrair dos bancos escolares. Tornou-se uma referência
na advocacia. A ditadura militar de 1964 tinha a sua ferocidade, Diomário tinha
a sua sagacidade camaleônica. Lacrou a boca e fechou os ouvidos. Omitiu-se,
quieto ficou o tempo todo.
Imiscuiu-se
na politicagem local pelas entranhas do grupo de Delorme, uma oligarquia que,
hoje, até que enfim, ele considera, corretamente, aristocrática, conservadora,
fechada, propriedade de um senhor, uma coisa que tem dono. Aí conviveu docemente
por longas décadas como bom e fiel serviçal, sempre agradando ao cacique
oligárquico da família Martins: fazia o papel de guardião dos interesses dos
Martins no Cenecista; foi o preposto da oligarquia Martins na tomada do PMDB
local, pois a ditadura começava a dar sinais de exaustão devido a luta e a
resistência popular, Diomário foi o pau-mandado nesta empreitada para servir
aos interesses escusos dos Martins; num ato de extrema bajulação à oligarquia
Martins, Diomário encabeçou a mudança do nome da Praça da Bandeira. São alguns
de seus feitos.
Ciente
dos bons e largos serviços prestados, metodicamente e diuturnamente, Diomário
achou que era merecedor do bom reconhecimento e que merecia uma oportunidade
por parte dos Martins, lançou-se candidato a deputado estadual. Foi rejeitado
pelo grupo e desistiu da candidatura. Recebia a boa-paga da oligarquia Martins,
que não dá prego sem estopa.
Diomário
nunca foi burro, aprendeu a lição. Sem pestanejar, soube aglutinar as
insatisfações dentro do grupo Martins e arribou com a mala, cuia e os votos de
uma parcela significativa de eleitores para a outra oligarquia, chefiada por
Antônio Colonnezi. Virou prefeito.
Um
administrador ardiloso. Combateu a prática da agiotagem que dominava a
prefeitura e implementou o sistema de terceirização que canaliza o dinheiro
público para empresários genéricos do grupo, num patamar que não resiste a uma
investigação mais apurada. Fez fama como gestor que pagou ao funcionalismo em
dias, principalmente, devido ao calote passado no funcionalismo pelos prefeitos
anteriores: Antônio e Luiz Carlos.
Um
administrador matreiro. Ganhou a reeleição com o campo de futebol e cercando
duas praças de um milhão de reais cada. Conseguiu vários convênios com a União,
principalmente na área de habitação popular, quadras esportivas, UPAS.
Administrou Ipirá na abestunta, no ‘vamo que vamo’, pois ao lado da fábrica
Paquetá instalou um conjunto residencial, numa área nobre e favorável à
concentração de fábricas. Não teve a perspectiva do progresso de Ipirá, sua
bitola era a do favorecimento ao grupo.
Diomário
foi um vencedor. O seu governo não representou nenhum momento de libertação e
participação da população ipiraense. Pontuou e pautou sua gestão pela
concentração do poder e pelo atendimento ao grupismo. Não se desligou do
sistema. Não virou cacique ou chefe único do grupo, mas transformou-se num dos
líderes. Não sei se ele acredita na luta e emancipação popular, não acreditando,
sua vida politica foi vitoriosa.
Diomário
quer continuar contribuindo de forma humilde, modesta e simples. Com esse
gesto, isenta-se de qualquer responsabilidade de uma derrota em 2016 e demarca
o seu interregno vencedor diante dos Martins por 12 anos consecutivos. Diomário
continua sendo o articulador-chave, imprescindível ao grupo por ter
conhecimento de causa. Tem mérito o suficiente. Com a entrevista indica a
essência e pontua o imprescindível, mas não concentra sob seu tacão todo o
rigor de uma próxima disputa política, seja pela vitoria ou, muito menos, pela
derrota. Tem a noção de que chegou o momento exato de passar o bastão para
outro.
A
Era Diomário consta da marca que registra 12 anos dos Martins fora do poder
municipal. Com essa entrevista Diomário redime-se de qualquer culpa por
qualquer resultado em 2016.
Diomário
agradeceu. Disse ser portador de um débito de gratidão impagável e que não
tinha espaço no seu coração para qualquer mágoa ou ódio. Que Diomário tenha a
paz merecida até para escrever sua biografia ou suas memórias, que será densa
pelo protagonismo, porque foi um coadjuvante que trilhou com eficiência nos
seus propósitos pessoais.
Tem
muita gente utilizando-se da estratégia de Diomário, querendo comer o grupo
oligárquico como se come mingau quente, pelas beiradas. Diomário teve
habilidade, competência e a paciência necessária para que isso ocorresse
corretamente e nos conformes do seu projeto político pessoal. Hoje, pode
tranquilamente despedir-se, agradecer de forma generosa ao povo de Ipirá e
descansar em paz nas delícias de Praia do Forte como um ato merecedor ao maior
articulador político que já apareceu nestas terras ipiraenses. O resto é
conversa.
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