quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

É DE ROSCA


Estilo: ficcão.
Natureza: novelinha.
Capítulo 14 (mês de outubro 2008, um mês de atraso)

O prato dois mais dois do cardápio da empregada Natalina era o mesmo 22 do menu do prefeito Dió. Tinha uma aparência soberba. Parecia um monumento envernizado, brilhante e fumegante. Era um lombo espesso e vinha acompanhado de rodelas de cebola e tomates vermelhos, com espetos de azeitonas, ao molho de alecrim. Os convidados estavam estonteantes e todos achavam-se boquiabertos. O governador tinha a primazia de saborear o prato 22, que ele tanto aplaudiu:
- Este, sem dúvida, é o mais glamuroso dos pratos, e eu tenho a maior convicção, se eu morasse nesta brilhante civilização dos meus amigos, eu só comeria esse prato 22 – disse o governador.


Todos bateram palmas. Muitos gritos ui ! ui! uiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii foram dados, afinal, era o governador que parlamentava. O governador continuava:
- E para acompanhar essa obra prima da culinária sertaneja, nada melhor do que bebermos a melhor água do mundo: a água da Embasa.


O partido do governador da localidade levantou em peso e aplaudiu sem cerimônias. O prefeito Dió para não perder o embalo e não ficar por baixo naquele cerimonial, olhou para a empregada Natalina e disse-lhe cantorolando:
- Me dá um copo d’água, eu tenho sede e essa sede pode mim matar – depois, dirigindo-se a empregada Natalina, completou – minha eficientíssima empregada Natalina, traga-me uma jarra com a água mais límpida e saborosa do planeta terra.


A empregada Natalina, com toda a sua simpatia, saltitava alegremente, ao tempo em que gritava:
- Ui ! ui ! uiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii, prefeito Dió.

Quando retornou, trazendo a jarra, que colocou em cima da mesa, ao tempo, que de sua boca ouvia-se um:
- Empuuuuuuurra prefeito Dió.


O governador olhou assustado e sem entender o que estava acontecendo, ao tempo, que os presentes estavam diante de um enigmático caso, que merecia uma explicação do anfitrião, afinal, todos que estavam ali, eram dignos de honras e gratidão pelos serviços prestados no período eleitoral. O prefeito Dió, não titubeou, chamou a empregada Natalina e disse-lhe.
- Minha querida empregada Natalina ! eu solicitei a Vossa pessoa uma jarra cheia de água.

- Mas tá cheia, prefeito Dió; vosmicê não tá enxergando ?


O prefeito Dió olhou para a jarra com uma visão mais apurada e com plena consciência do que falava, fêz uma observação melindrosa:
- A minha querida empregada Natalina está equivocada; pegue a jarra e coloque a nossa saborosa água da Embasa, que todos os presentes estão no afã de saborear o líquido mais puro e palatável da face da terra.

- Mas seu prefeito Dió, vosmicê tem que cair na compreensão que se eu botá mais uma gota de água, vai derramá e molhá a toalha nova, qui vosmicê comprou esta semana, na feira do Centro de Abastecimento.

- Minha querida empregada Natalina ! não entre em descompasso com os meus ordenamentos, coloque a água da Embasa na jarra e ponha-a na mesa.

- Prefeito Dió ! eu não posso fazê uma disgrameira dessa. Vosmicê não tá veno que a jarra tá cheia de produto que a Embasa vende, e que se eu colocá mais uma gota como é o querer de vosmicê, vai derramá na beira do governador. Será que tanta gente de bons conhecimento como tá aqui, num compreende uma besteira dessa.


O governador como bom conciliador e na obrigação de resolver aquele impasse, interferiu, indagando a empregada Natalina:
- Nada mais justo que a empregada Natal... Natalina, é o seu nome, diga a todos nós quais são os preciosos produtos fornecidos satisfatória e eficientemente pela Embasa aqui nesta cidade.

- Até que infim apareceu uma alma de Deus compreensive neste recinto. Eu enchi a jarra de produto da Embasa. Fui lá na torneira da pia, abri a torneira e botei a jarra embaixo, aí a jarra foi enchendo de vento, quando tava nas rasura, eu fechei a torneira. Se eu butá uma gota d’água, ela vai derramá, prumode que tá cheia de vento.


O prefeito Dió ficou vermelho, não como na sua juventude, mas de raiva. Quase que perdendo a paciência, disse à empregada Natalina:
- Quem foi que lhe disse que a Embasa fornece vento ? Isso é conversa de subversivo.

- É prumode de minha pessoa, que vosmicê não cai na faca cega da Embasa. Toda vez que eu sinto nos ouvido a chiada na casa da vizinha, eu sei que é o vento da Embasa, aí eu corro e fecho o registro, dou um tempo de vinte e dois minutos, adispois, eu abro o registro para passá a água. É prumode disso que vosmicê só paga R$ 11,20 de água e a Embasa fica sem cobrá o vento. Agora, vosmicê tá no esquecimento que mim elogiou por isso ? E disse que eu estava certa.


O prefeito Dió ficou parado, mas todo mundo sabe que o prefeito Dió não dorme no ponto e, como sempre, saiu-se com uma jogada de mestre dos mestres:
- Tá certo Natalina. Agora, pegue a jarra, leve-a para a cozinha, jogue fora este nobre produto da Embasa que é o vento, e coloque o outro nobre produto da Embasa que é a água, até que ela fique cheia de água. Compreendeu ? – quando a obediente empregada Natalina saiu com a jarra, ele completou para que todos ouvissem – É doida.


Natalina voltou com a jarra e o prefeito Dió na expectativa de mudar de assunto, indagou-lhe:
- Minha empregada Natalina ! de que carne é feito esse saboroso e finíssimo prato do 22 ?

- É de carne clandestina de carneiro.


O prefeito Dió finalmente perdeu a calma e gritou para a empregada:
- Paaaaaara Natalina. Lá vem você com esse tal de carneiro, logo não tá vendo que esse Matadouro de Ipirá não vai sair tão cedo, principalmente agora que a firma da licitação abandonou de vez a obra. O dinheiro acabou. Não tem mais dinheiro. A obra não acabou. Que sofrimento ! e agora, o que eu devo fazer ?

- Vosmicê toma um vem-prá-cá e impurra o 2 e 2; adispois vosmicê aprende a fazê contrato com firma, prumode de se ficá só nessa tale de licitação as coisa não toma rumo e esse Matadouro de Ipirá já tá prá lá de vergonheira e num vá me adizê que vosmicê tá igualzinho a Luiz do Demo ou PFL, fantasiado de 15, que levou oito anos e nada. Vosmicê já tem quatro.
- O quê ? – indagou o governador.


SUSPENSE: o que será que vai acontecer com a empregada Natalina ? será
que a autoridade vai desconfiar da carne clandestina ou vai gostar ? E o
prefeito Dió, será que está por dentro do que está acontecendo no seu
banquete ?

Leia o capítulo 13: mês de outubro 2008, logo abaixo.

OBSERVAÇÃO: essa novelinha é apenas uma brincadeira literária que
envolve o administrador e o matadouro e, sendo assim, qualquer semelhança
é mera coincidência.

Um comentário:

Lilian Simões disse...

Morro de curiosidade pra saber se Natalina foi ver Silvanno rsrsrs abração, Agildo.